É que à noite bate uma tristeza
tão profunda, minha querida. Um sentimento inexplicável de solidão, um aperto
no coração, na alma, nos olhos, que me faz chorar, perder o tino, a calma, e é
nesse momento que a vontade de viver, assim como o ar, começa a ficar
rarefeita. Enquanto o cigarro queima ao meu lado, o café esfria ao mesmo passo,
parece que o relógio desacelera, o frio fica mais intenso. Como tá gelado aqui!
O mundo vai girando, as coisas
vão acontecendo, ou não, e talvez seja esse o problema, nada acontece, aquela
velha história de que tudo muda começa a não fazer muito sentido, e eu perco os
sentidos enquanto me perco na viagem pelos sentimentos perdidos, abraços,
beijos, lágrimas, sorrisos, tudo some, vai-se embora como a névoa que o sol
desfaz.
Meu coração se acelera enquanto
fico aqui desnorteado a lembrar de coisas que não aconteceram, a esperar por
pessoas que não fizeram compromisso de vir. Não é nessa estação que o meu trem
passa, estou perdido. Torpemente silenciado pelas emoções que coloquei pra fora
sem pensar, engraçado, meu bem, eu sempre fui assim: fiz, depois pensei. Agora o
descompasso me toma, não sei se a alma se acelerou ou se as artérias estão se
inflando mais e mais a cada minuto pela pulsação forte do que me faz viver – ou
me tira o júbilo que isso teve, um dia.
Tristeza, saudade, falta de
ocupação, não sei o que se passa. Ou a família me desamparou, bobagem! Nunca cobrei
esse amparo deles, grande erro. Talvez por ter procurado abrigo onde nunca
existiu sequer um caco de telha pra me proteger da tempestade que é esse mundo,
tão docemente cruel. A música vai me tomando, aos poucos surge um novo
descompasso, regendo a tormenta de pensamentos que me vem à cabeça neste
momento.
E assim eu vou terminando mais uma
noite, acompanhado por uma sutil solidão – grande companheira no inverno –
enquanto penso nos amores perdidos, e naqueles que nem cheguei a conquistar,
que foram os mais doloridos, pois foram os que mais receberam de mim, todas
aquelas coisas boas que estavam enterradas aqui dentro, bem fundo, e que foram
jogadas às traças, sem piedade, sem ter, pelo menos, um sorriso agradecido e
piedoso.
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